Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria
científica
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N° 13 (1991: 5)
Antonio Alexandre Bispo
Prof. Dr.Guilherme Figueiredo, Reitor da Universidade do Rio de
Janeiro Estava em Paris, quando a Profa. Cleofe Person de Mattos contou-me
que ia com o seu Coro à Espanha e à Alemanha. Ia passar pela França,
mas não ia cantar nesse país, porque não havia nenhum lugar que
abrigasse a Associação de Canto Coral. Fui, então, iluminado por
uma luz que julgo ser a luz de Carlos Gomes, a luz de Mário de
Andrade, a luz das admiráveis paulistas que foram Guiomar de Novaes
e Antonieta Rudge, e pensei: um conjunto coral, de música sacra
brasileira, não podia cantar noutro lugar que não fosse a Catedral
de Chartres. Escreví então uma carta ao Arcebispo de Chartres,
enviando-lhe um disco do conjunto de Cleofe Person de Mattos.
O Arcebispo respondeu-me, dizendo: - o seu coral não cantará uma
missa, mas duas! Foi assim que pela primeira vez um conjunto brasileiro,
de cantores brasileiros, cantou música sacra na Catedral de Chartres:
trechos de missas, conjugados numa só missa. Trechos de missas
de Villa-Lobos, de Francisco Mignone e do Pe. José Maurício. Discurso de abertura do I° Congresso Brasileiro de Musicologia,
São Paulo 1987, Anais, ISMPS 1991, 19-20
Com a apresentação da Missa São Bernardo de Offida de J. Haydn pelo Coro da Associação de Canto Coral e pela Orquestra da Universidade Federal Fluminense sob a direção de Carlos Eduardo Prates, na Sala Cecília Meirelles, abriu-se, no dia 8 de dezembro de 1990, o Ano do Cinqüentenário da Associação de Canto Coral (12 de dezembro de 1941 - 12 de dezembro de 1991).
Em dezembro de 1941, formandas de Canto Orfeônico de Curso da
Universidade do Distrito Federal, criada por Anísio Teixeira e
que tinha como mentor H. Villa-Lobos, resolveram dar continuidade
à prática de canto coral mesmo após o término de seus estudos.
A esse grupo associaram-se outras jovens que, juntamente com o
Quarteto de Cordas hoje denominado da Guanabara, assumiram o nome
de Sociedade Propagadora de Música de Câmara e Sinfônica.O concerto
de estréia foi regido por Lília Faustino de Figueiredo, Cleofe
Person de Mattos e Dinah Buccos Alves. Cleofe Person de Mattos
assumiu a Direção Artística do conjunto.
Cleofe Person de Mattos, presidente pelo Brasil da Curadoria científica
do ISMPS e presidente da Sociedade Brasileira de Musicologia,
é a personalidade central na história da Associação de Canto Coral.
Tendo estudado Composição e Regência na Escola de Música da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, complementou a sua formação em estágios
na Alemanha (Detmold). Como pesquisadora, dedicou a sua vida ao
levantamento e estudo da obra do Pe. José Maurício Nunes Garcia.
Dentre as suas publicações, salienta-se o Catálogo Temático das
obras de J.M. Nunes Garcia. Esteve presente em várias reuniões
realizadas na Alemanha para a fundação do ISMPS
Com a denominação de Coro Pró-Música, mantida até 1946, o grupo dedicou-se à apresentação de obras de alto valor artístico, incluindo desde logo obras de autores brasileiros, algumas compostas especialmente para o grupo, como a obra A Infinita Vigília de Brasílio Itiberê. O Coro apresentou, em primeira audição, obras de Francisco Braga, Frutuoso Viana, Elizabeth Zamorano Nunes, José Vieira Brandão e Francisco Mignone. No dia 21 de setembro de 1946, no Auditório do Ministério da Educação, o Coro apresentou-se com a denominação, que seria definitiva, de Associação de Canto Coral. A inclusão de vozes masculinas deu-se oficialmente no concerto natalino realizado no dia 4 de dezembro de 1949 pela Rádio MEC. No ano comemorativo de Bach, 1950, a Associação de Canto Coral apresentou o Moteto Jesu meine Freude e duas Cantatas (N°s 79 e 46) , dirigidas por H.J. Koellreutter, além do Magnificat" regido por Lamberto Baldi, iniciando assim o longo trabalho que desenvolveria em pról da difusão da obra do grande compositor no Brasil.
A partir de 1951, a Associação de Canto Coral passou a apresentar-se com orquestras do Rio de Janeiro, dedicando-se particularmente à divulgação de obras inéditas no Brasil, como La Passione de Malipiero, levada sob a regência de Nino Sanzogne, diretor no Scala de Milão. No ano do IV° Centenário do Rio de Janeiro, a Associação de Canto Coral preparou, juntamente com a Orquestra Sinfônica Nacional, importantes obras. Dedicando-se também à música contemporânea, realizou numerosas apresentações, especialmente de obras de I. Strawinsky: a Symphonie de psaumes, a Missa, a Cantata composta em 1951-1952, Oedipus Rex e o Canticum Sacrum. Ad honorem S. Marci nominis (1955), este levado no Rio de Janeiro no ano seguinte à sua estréia em Veneza. A Missa foi apresentada sob a regência do próprio I. Strawinsky na Igreja da Candelária.
No repertório da Associação de Canto Coral dos anos sessenta destacaram-se obras representativas da música francesa do século XX, ciclo iniciado com a apresentação de Le roi David de A. Honegger, em 1960. Por ocasião das comemorações do centenário de Debussy, em 1962, a Associação de Canto Coral apresentou Sirènes e La damoiselle élue, sob a regência de Alceu Bocchino. Por ocasião das comemorações de M. Ravel, em 1975, apresentou, com a Orquestra Sinfônica Brasileira, sob a regência de Isaac Karabtchewsky, L'enfant et les sortilèges. Da realização de Daphne et Chloé participaram também Os Curumins, coro infantil da Associação preparados por Elza Lackschevitz. Em 1965, o coro a cappella da entidade realizou uma viagem artística pela Europa, apresentando-se em 23 concertos (Paris, Londres, Madrid, Colonia, Viena, Porto e Lisboa). Na Catedral de Chartres apresentou obras de José Maurício Nunes Garcia e Heitor Villa-Lobos.
Em 1977, a Associação de Canto Coral representou o Brasil no Festival de Coros de Santiago do Chile, cantando a Missa em Fá menor de Francisco Mignone.Desde 1984 realiza trabalho conjunto com a Camerata Rio de Janeiro, dirigida por Henrique Morelenbaum, no sentido de preparar e gravar obras do passado brasileiro, entre elas a Missa de João de Deus de Castro Lobo, as Matinas do Natal e a Missa de Nossa Sra. do Carmo de José Maurício Nunes Garcia e o Magnificat de Manoel Dias de Oliveira.
O programa inaugural do Ano do Cinquentenário chama a atenção
para um aspecto marcante da vida artística da Associação de Canto
Coral, ou seja, a defesa do patrimônio musical brasileiro:
"Atitude que se afirma, não só interpretando a primeira audição
mundial do Magnificat-Alleluia de Villa Lobos, em 1959, por permissão
do Vaticano, a quem a obra foi oferecida, mas sobretudo na defesa
constante do nosso patrimônio musical, apresentando-o em concertos,
gravando quando possível o legado daqueles que compõem o nosso
passado musical. Assim tem sido com a criação dos compositores
setecentistas de Minas Geras presentes desde 1958 e valorizando
a nossa discografia. Mas é sobretudo a obra de José Maurício Nunes
Garcia a figura de maior freqüência nas realizações da ACC em
concertos e gravações. Não só em obras "a cappella" - que revelou
e publicou - como várias e grandes obras, quase todas inéditas
em tempos contemporâneos, apresentadas em diferentes épocas. Desde
o pioneiro Edoardo de Guarnieri (Requiem e Missa de Santa Cecília),
gravadas em 1958 e 1959, ambas em Disco Festa, o que faz jus a
uma lembrança para o nome de Irineu Garcia. A Missa de Nossa Senhora
da Conceição em 1967 com Karabtschevski. O Domingo de Ramos, a
Ladainha das Dores e muitas outras obras regidas por Alceu Bocchino.
Mais recentemente apontam como dirigentes Osman Gioia e Ernani
Aguiar.
Tem sido esta a realidade maior dos últimos anos da Associação de Canto Coral, mas devem ser acrescentadas as atuações com a Orquestra "Pro-Música" (PETROBRÁS) dirigida por Armando Prazeres.
A Associação de Canto Coral atinge, pois, uma demarcação cronológica significativa e por certo muito rara em conjuntos amadores. Nesses anos contou sucessivamente com três regentes-assistentes: Elza Lackchevitz, Carlos Alberto Figueiredo e Maurílio Costa, prestando à ACC colaboração efetiva. Chegado à marca representada pelo "ano do cinqüentenário', cabe naturalmente a indagação diante dos tempos novos que devem chegar também para a música e para os corais de amadores. A resposta pode não ser difícil, nem tão fácil de ser cumprida, mas continuará a depositar os resultados de sua ação artística nos mesmos devotados cantores como aqueles que se sucederam ao longo dessas décadas e têm sido a garantia da sobrevivência da Associação de Canto Coral."