Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria
científica
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No. 90 (2004: 4)
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© Foto: A.A.Bispo 2004 Arquivo A.B.E. |
Politonalidades na percepção do meio e a sistemática na criação
450 ANOS DE SÃO PAULO
COLÓQUIO INTERNACIONAL DE ESTUDOS INTERCULTURAIS
ACADEMIA BRASIL-EUROPA
Guaratiba, 20 de março de 2004
Como exposto nos relatos anteriores, o Colóquio Internacional
de Estudos Interculturais, realizado pela Academia Brasil-Europa
em cooperação com universidades e instituições do Brasil e do
Exterior pelos 450 anos de fundação de São Paulo, dedicou a segunda
parte do evento para sessões a serem realizadas no Rio de Janeiro.
Pareceu ser significativo, nas comemorações da data, considerar
mais de perto as relações entre o universo paulista e o Rio de
Janeiro, relações que marcaram a história cultural sob múltiplos
aspectos e que não foram unilaterais.
Durante a visita ao Sítio Burle-Marx, os participantes do Colóquio
tiveram a oportunidade de vivenciarem de forma concreta e sensível
uma obra criadora que como poucas outras exprime as relações entre
a Cultura e a Natureza e a sua relevância para o processo criador.
Ao mesmo tempo, considerou-se o papel da música no universo cultural
de Burle-Marx. Na sessão vespertina que se seguiu à visita, não
apenas as impressões obtidas deveriam ser discutidas. Também e
sobretudo os elos apontados com a música nas relações entre Cultura
e Natureza deveriam vir a ser alvo de reflexões mais profundas.
Se as sessões no interior de São Paulo haviam sido dedicadas a
reflexões teórico-culturais relacionadas com o tema Lírica da
terra, as de Paraty com a Lírica das águas, as de Guaratiba desenvolveram-se
sob a perspectiva de uma Lírica dos céus.
Em palavras introdutórias, A.A.Bispo lembrou do significado dos
"céus" e dos elementos fogo e ar no sistema de concepções da antiga
filosofia da natureza e no simbolismo das imagens culturais. As
reflexões, aqui, se aprofundadas, levariam novamente ao antigo
sistema das disciplinas derivado da antiga filosofia e a uma visão
do mundo de fundamentação ontológica. Entretanto, esse complexo
temático, já tratado em várias outras ocasiões em eventos da A.B.E.
não deveria consistuir o principal escopo das discussões da sessão.
O interesse dirigiu-se a concepções relacionadas com o ar na sua
simbologia vinculada ao intelecto e à esfera das idéias e das
abstrações. Nesse contexto, considerou-se a relação entre a música
e o binômio Cultura/Natureza nos seus vínculos com a" atmosfera"
sensorialmente captável, com a percepção do meio, de situações
urbanas e culturais e de imagens e identidades de regiões e bairros.
Sob a impressão do Sítio Burle-Marx retomou-se aqui uma discussão
sobre Música Contemporânea e Estudos Culturais levada a efeito
em seminário na Universidade de Bonn e que salientou o papel do
Brasil na obra de Darius Milhaud e sua repercussão internacional.
Uma orientação cultural dos estudos musicológicos dirige a atenção
da pesquisa de Milhaud a outros aspectos do que aqueles tratados
convencionalmente. Não se trata apenas de mostrar em obras do
compositor configurações melódicas, rítmicas e formais assimiladas
da música brasileira. A influência do Brasil na sua obra criadora
foi muito mais profunda. A partir da percepção sonoro-espacial
de diferentes grupos carnavalescos que se apresentavam em desfile,
com a superposição de diferentes planos sonoros e transformações
tonais causadas por fenômenos acústicos determinados pela aproximação
e o afastamento de grupos, o compositor chegou ao desenvolvimento
de processos criativos baseados na bi-ou politonalidade e que
marcariam de forma significativa a história da música do século
XX.
A questão que se colocou no seminário e que foi apresentada e
discutida na sessão disse respeito à análise dos processos sistematizadores
empregados por Darius Milhaud na sua obra, sobretudo quanto à
lógica modulatória. Como teria o compositor sistematizado as transformações
melódicas que constatara na percepção de grupos que se aproximam
e afastam?
Como demonstrado em análises de suas obras, o compositor partiu
aqui de círculos de quintas no seu processo criativo. A sua produção
musical adquire um cunho de ainda maior coerência construtiva
do que aquela normalmente apontada. O interesse teórico pelo círculo
de quintas e de sua manipulação combinatória pode ser porém estudado
na sua inserção em determinado contexto da história teórico-musical
e da composição na França. Tem-se aqui, portanto, uma questão
da aplicabilidade de sistemas teóricos pré-concebidos abstratamente
na sistematização de impressões baseadas na percepção acústica
em situações do carnaval brasileiro e de temas que caracterizavam
a imagem de bairros do Rio de Janeiro.
Vários aspectos dessa questão foram tratados por participantes
do Colóquio, salientando-se aqui a sua relevância para estudos
interculturais nos seus elos com o meio ambiente e imagens mentais
de cidades. Nesse contexto, Michael Janke apresentou um trabalho
sobre a música e a organização espacial do Rio de Janeiro aos
olhos do europeu Darius Milhaud.