Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria
científica
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No. 90 (2004: 4)
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© Foto: A.A.Bispo 2004 Arquivo A.B.E. |
Academia Brasileira de Música e Academia Brasil-Europa
450 ANOS DE SÃO PAULO
COLÓQUIO INTERNACIONAL DE ESTUDOS INTERCULTURAIS
ACADEMIA BRASIL-EUROPA
Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro, 20 de março de 2004
A sessão realizada no Rio de Janeiro do Colóquio Internacional
de Estudos Culturais pelos 450 anos da cidade de São Paulo teve
lugar no auditório da Fundação Casa de Rui Barbosa, no dia 24
de março. O evento foi preparado e realizado pela Academia Brasileira
de Música. Os participantes foram recebidos pelo Mtro. Edino Krieger,
presidente da instituição, pela Profa. Dra. Mercedes de Moura
Reis Pequeno e por vários membros da A.B.M.
O Mtro. Edino Krieger, abrindo a sessão, deu as boas vindas aos
participantes. A Profa. Mercedes de Moura Reis Pequeno, a seguir,
expôs o estado atual do projeto da Bibliografia Musical Brasileira,
sob a sua direção, um dos maiores empreendimentos musicológicos
do Brasil, de antiga tradição, dando continuidade ao trabalho
de Luís Heitor Correa de Azevedo. Elucidou os seus objetivos,
o seu histórico e as dificuldades atuais para a sua realização.
Mencionou as novas situações criadas pela intensificação da produção
intelectual e pelos novos meios de difusão e publicação eletrônica.
Salientou as colaborações já prestadas pelo presidente da A.B.E.
e manifestou o desejo que essa cooperação pudesse vir a ser intensificada.
Após as palavras dos representantes da A.B.M., Antonio Alexandre
Bispo, em nome da A.B.E. apresentou os agradecimento de todos
os participantes do Colóquio pelo acolhimento e pela possibilitação
do encontro. Expressou sobretudo a sua gratidão à Profa. Dra.
Mercedes de Moura Reis Pequeno pela contínua colaboração que vem
prestando aos trabalhos da A.B.E. no decorrer dos anos, recordando
aqui a sessão conjunta com a Fundação Biblioteca Nacional na Escola
de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1992.
Nas suas palavras, A.A.Bispo salientou que o significado do encontro
da Academia Brasileira de Música e da Academia Brasil-Europa reside
não apenas na oportunidade de congraçamento que oferecia e nas
perspectivas que abre para futuras cooperações. Deve ser procurado
numa dimensão mais profunda e que exige uma consideração sensível
de desenvolvimentos histórico-culturais.
Não basta lembrar que Martin Braunwieser, por assim dizer o mentor
espiritual da A.B.E., foi um dos primeiros membros da A.B.M. e
que documentos originais da época da fundação da Academia Brasileira
de Música estão conservados e expostos no Centro de Estudos europeu
da Academia Brasil-Europa.
É necessário recordar que os elos entre Villa-Lobos, o grande
mentor da A.B.M., e Martin Braunwieser eram muito mais antigos,
e que já no início da década de 30 a cooperação entre ambos possibilitara
a realização de concertos de obras villa-lobianas em São Paulo.
Testemunho do próprio punho de Villa-Lobos indica o significado
dessa colaboração.
Tal proximidade na época, pouco considerada nos estudos brasileiros,
permite também que se compreenda influências mútuas, algumas delas
de grandes conseqüências. Martin Braunwieser trazia de sua formação
cultural centro-européia, de forma profundamente enraizada, o
sentido pela prática coral popular e pelo canto coral em vernáculo,
a convicção de sua importância para a formação de comunidades,
para a educação e para a integração de grupos na sociedade. Trazia
também a sensibilidade para as diferentes inserções e conotações
político-culturais dessa prática, resultante de desenvolvimentos
histórico-culturais europeus. Nos primeiros anos de sua integração
no Brasil, foi esse um dos principais tenores de sua atividade
entusiástica e foi nessa fase que Villa-Lobos o conheceu.
Por outro lado, Martin Braunwieser estava, desde a sua formação
no Mozarteum de Salzburg e de seus estreitos contactos com Paumgartner,
vinculado com o movimento então renovador de redescobrimento da
música antiga, em particular de Bach, um vínculo que levaria nada
menos à fundação da Sociedade Bach de São Paulo, em 1935. O movimento
Bach estava pela sua própria natureza compreensívelmente inserido
no universo cultural do mundo de língua alemã, ao qual Martin
Braunwieser pertencia pela sua proveniência. Tinha, assim, pela
sua própria formação e experiência, também aqui a capacidade para
discernir diferentes conotações político-culturais desse movimento,
que incluia, ao lado de pesquisadores de orientação espiritual
humanista também representantes de acentuados posicionamentos
nacionalistas e nacional-socialistas.
A posição de Martin Braunwieser seria aqui sempre a universalista
de um Albert Schweizer, e já no início da década de 30, à época
da presença de Villa-Lobos em São Paulo, publicava uma espécie
de manifesto pelos valores universais humanos da música contra
a sua instrumentalização para fins políticos.
O relacionamento entre Martin Braunwieser, fundador da Sociedade
Bach de São Paulo e grande representante do Canto Coral em São
Paulo, e o compositor das Bachianas Brasileiras e grande organizador
do Canto Orfeônico no Brasil foi, assim, ao mesmo tempo próximo
e singularmente ambivalente, e as diferenças apenas podem ser
percebidas através de análises aprofundadas e sensíveis. Elas
puderam ser captadas através de informações do próprio Martin
Braunwieser durante a sua última estadia na Europa, em colóquio
da A.B.E. em 1989, e foram debatidas durante evento dedicado especificamente
a esse complexo de questões por ocasião do triênio pelas comemorações
dos 500 anos do Brasil, no ano 2000. Nessa ocasião, procurou-se
analisar e entender de forma contextualizada o aparentemente estranho
texto de Villa-Lobos, até mesmo de tom ameaçador, dirigido ao
círculo dos cultivadores de Bach em São Paulo na década de 40.
A A.B.M. e a A.B.E. inserem-se, assim, em contextos histórico-culturais
complexos e que necessitam ser diferenciados através de estudos
a serem realizados sob diferentes perspectivas. Aqui é que reside
uma das grandes perspectivas para um trabalho de cooperação e
a relevância das questões envolvidas supera de muito esferas institucionais.
Seguiu-se um oferecimento recíproco de publicações.
Em nome de Portugal, o Mtro. Manuel Ivo Cruz lembrou do significado
particular das relações entre Portugal e o Brasil para os estudos
musicais e culturais. Nesse contexto, salientou as atuais comemorações
de Souza Carvalho na Europa e no Brasil
Após a sessão de trabalhos, houve uma apresentação musical a cargo
dos artistas Maria Bragança e Antonio Carlos de Magalhães.
Seguiram-se trocas de idéias dos participantes da sessão.
Os membros da A.B.E. e os congressistas tiveram a oportunidade
de constatar a grande produção editorial e sonora da A.B.M. apresentada
em exposição.