Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica
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N° 31 (1994: 5)


 

Foto A. A. Bispo. Acervo I.S.M.P.S.

1994: 100 anos de Renato Almeida

Ciclo de estudos

Música nas relações culturais euro-brasileiras

Sistematização e integração dos estudos culturais

- Amazônia e Brasil Central -

projeto do ISMPS e.V. /I.B.E.M.
com o apoio de diversos órgãos oficiais e particulares, universidades e museus
desenvolvido concomitantemente com o
projeto
As culturas musicais indígenas no Brasil
do
Institut für hymnologische und musikethnologische Studien
realizado com o apoio do
Serviço das Relações Exteriores da Alemanha
sob a direção de

A. A. Bispo

Roraima

agradecimentos

Biblioteca do Estado
Diocese de Roraima
Universidade Federal de Roraima
Instituto de Antropologia
Escola de Música
Conselho Indigenista Missionário CIMI-Norte
Associação do Índio
Comunidade Makuxi-Fazenda São Marcos

 

INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS RELAÇÕES CULTURAIS EUROPA-RORAIMA

NOME E IMAGEM DO ESTADO NA EUROPA

(anotações de aula, ISMPS)

Antonio Alexandre Bispo

(partes, sem notas e bibliografia)

 

Roraima é um Estado com 230.104 km2 no Norte do Brasil e que até 1962 era denominado de Território do Rio Branco. Após uma fase de transição, foi elevado a Estado em 1990. Anteriormente, essa região fazia parte do Estado do Amazonas, do qual foi desmembrada a 13 de setembro de 1943 pelo decreto-lei 5.812. A capital de Roraima é Boa Vista (77132 habitantes - IBGE, 1990), originada de povoação fundada no século dezenove. Até há poucas décadas, Boa Vista era uma cidade pequena, hoje apresenta ruas largas e edifícios modernos (sobretudo a Catedral, a Biblioteca e a Universidade), assim como novos bairros de crescimento rápido e nos quais vivem muitos índios vindos do Interior.

Ambos os nomes, Rio Branco e Roraima, referem-se a fatos geográficos. O nome "Rio Branco" diz respeito ao rio que corta a região e que em parte a inunda, desaguando no Rio Negro. Já essa denominação indica o relacionamento entre os dois rios e as regiões por eles banhadas. O nome Roraima refere-se ao monte na região alta limítrofe entre a Venezuela, o Brasil e a Guiana. Essa montanha representa uma formação natural singular com as suas paredes íngremes e com as suas cachoeiras. A ele estão vinculados mitos e contos, ocupando uma posição significativa na visão do mundo dos índios. O nome tornou-se mundialmente conhecido sobretudo através da obra de Theodor Koch-Grünberg (Roraima = montanha rosada).

A mudança de nome do território pode ser considerada como indício de uma transformação das associações que se prendem à região e, com isso, com uma mudança da sua imagem para observadores externos e da auto-imagem de seus próprios habitantes. Como Rio Branco, esse território despertava associações não apenas com o vulto histórico de mesmo título mas sim também com o rio assim denominado e com a região inundável por ele cortada e ligada do ponto de vista geo-político e cultural com Manaus. Do ponto de vista luso-brasileiro, seria a partir do Rio Negro que essa região deveria ser considerada, uma vez que pertenceu na época colonial à esfera de influência da "Capitania do Rio Negro". O nome traz à lembrança a época dos litígios internacionais a respeito de limites, nas quais salientou-se a personalidade de José Maria da Silva Paranhos (1819-1880) e que por isso recebeu o título de Barão e, depois, de Visconde de Rio Branco.

Sob a denominação Roraima, as atenções se dirigem à formação natural mais significativa da região e, ao mesmo tempo, às características de sua situação limítrofe e às relações históricas e culturais com os países do Norte da América do Sul e da região do Caribe. Justamente devido a esse relacionamento com questões de identidade cultural própria, de auto-consciência e de sentido comunitário do jovem Estado é que se deveria dedicar particular consideração à história e à cultura indígena.

No passado, esse território foi associado muitas vezes com a idéia do "El Dorado". Ferdinand Denis considerou-o, como outros, como "Guiana portuguesa", exprimindo a opinião que essa região viria a ser possivelmente o "reino mais promissor do mundo": "Nessas áreas parece que se localiza o legendário lago Parima, que às vezes é indicado nos mapas, às vezes não. Esse lago, tão famoso na geografia da América do Novo Mundo não é porém nada mais do que talvez uma junção temporária das águas, assim como a lenda da cidade dourada de Manoa que se levantaria às suas margens nada mais é nas suas origens do que provavelmente uma lembrança tênue das antigas cidades que foram já descobertas na América do Sul e, principalmente, daquelas formações rochosas brilhantes à beira de alguns rios e cujo esplendor parece ter iludido viajantes."

A imagem de Roraima ficou prejudicada, nos anos noventa do século XX, pelos graves incêndios que incontroladamente destruíram grandes áreas e que assolaram vários grupos indígenas. Esta foi até mesmo uma das razões que deu origem a uma discussão a respeito da má imagem do país no Exterior. Esses incêndios encontraram situações favoráveis na vegetação de fácil combustão da savana. Já Koch-Grünberg citou o mar de chamas causado pelos seus companheiros que haviam ateado fogo à vegetação: "Trechos de montanhas inteiros estão em chamas. Os índios acendem durante o caminhar fósforos que tinham obtido de mim em troca de outros produtos e atiravam-nos no capim sêco. O vento oriental faz o resto. Freqüentemente se observa a evolução de colunas de fumo que percorrem com grande rapidez um certo trecho e depois desaparecem. Os índios fazem aqui diferença entre dois tipos: o Kuranaú, que não é perigoso, e o Wakalámbo, perigosíssimo, que faz com que as pessoas sejam atiradas ao chão ou jogadas ao alto das árvores. Wakalámbo desempenha um papel nos seus mitos."

Quando se fala na imagem de Roraima, então não se pode deixar de considerar a lenda transmitida por Theodor Koch-Grünberg a respeito do Makunaíma da Serra do Banco. Essa figura, que teria transformado em passado remoto homens e animais em pedra e criado passagens perigosas nas correntezas dos rios, adquiriu significado literário e difusão em várias camadas da população brasileira através de obra do escritor Mário de Andrade (1893-1945): ela representa a contribuição mais evidente da cultura indígena dessa região para a cultura brasileira no seu todo. O conceito "Makunaíma" (ou "makonáima", "makenaima" etc.) foi elucidado da seguinte maneira por Theodor Koch-Grünberg: "O nome do mais alto herói tribal, Makunáima, inclui pelo que tudo indica como componente principal o termo Máku = ruim e o sufixo aumentativo ima = grande. Assim, o nome significa mais ou menos "o grande mau", o que corresponde ao caráter intrigante e portador de infelicidades desse herói. Por isso, é estranho que os missionários inglêses utilizaram esse termo para qualificar o Deus dos cristãos nas traduções da bíblia na língua dos Akawoio. Uma série de mal-entendidos parece vincular-se assim com a recepção do termo indígena e dos conceitos a ele associados. É quase que impensável que os missionários da primeira metade do século XIX tenham empregado uma palavra tão depreciativa para a designação de Cristo. Seria concebível, porém, que os índios tivessem interpretado negativamente conceitos religiosos dos europeus, uma vez que haviam tido experiências negativas com eles. Mais provável, porém, é que aqui se tem um caso do pensamento tipológico, ou seja, representava-se o Grande Mau e Traiçoeiro para que o contraste com o anti-tipo ficasse mais expressivo.

A imagem de Roraima no mundo adquiriu nas últimas décadas uma conotação particularmente negativa sobretudo pela problemática indígena. As dificuldades resultantes dos contactos dos indígenas com grupos não-indígenas não são novos. Já Theodor Koch-Grünberg encerrou o seu livro "Roraima", em 1924, com uma frase comovente a respeito da perda das condições felizes de vida do passado, - que se expressavam através da música e da dança - ,devido a moléstias transmitidas pelos brancos e pela ação de mineradores: "Acabou a alegria ingênua, acabaram-se as solenes danças, o Parixerá, o Tukuí, acabaram-se os bringuedos alegres da juventude nas noites de lua cheia na praça da aldeia. Felizes aqueles que morreram na época certa!"

O mundo atual foi abalado de forma extraordinária sobretudo pela divulgação do "genocídio" dos Yanomami. Também no Brasil desenvolveu-se a partir desse triste acontecimento o grande movimento da "Ação pela cidadania", lançado em janeiro de 1989 pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, entre outras instituições. O então presidente da Conferência, D. Luciano Mendes de Almeida, empenhou-se pessoalmente nessa campanha.

A Diocese de Roraima chamou por várias vezes a atenção internacional para as dificuldades que surgiram com a propagação de fazendas nos territórios reinvidicados pelos índios e pela atividade dos garimpeiros. O centro de informações da Diocese lançou publicações que contribuiram para a divulgação ampla de conhecimentos a respeito dos índios de Roraima, de sua história e sua cultura.

(...)

 

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