Timbre Correspondencia Euro-Brasileira

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N° 14 (1991: 6)


 

MARTIN BRAUNWIESER E O "ESPÍRITO DE MOZART" NO BRASIL

Antonio Alexandre Bispo

 

Como foi salientado no último número desta publicação, a passagem dos 90 anos de Martin Braunwieser, comemorado no dia 6 de junho próximo passado, foi o fato mais significativo do corrente ano para a Musicologia no Brasil. A importância real de Martin Braunwieser para a vida musical, a composição e a educação musical supera de muito a atenção que até agora foi-lhe dedicada em obras de história da música, léxicos e em artigos de jornais e revistas. Martin Braunwieser é um dos grandes vultos da música do Brasil e o seu reconhecimento musicológico contribuirá para a necessária reconsideração da história da música do século XX no país.

A sua obra de vida pode ser estudada sob diferentes perspectivas. Em homenagem a Martin Braunwieser, foi publicada, pelo editor, a biografia Martin Braunwieser: Espiritualismo, Nova Objetividade, Humanismo Clássico e as Tradições Musicais do Oriente e do Ocidente na Pedagogia e na Criação Artística (Contribuição ao Estudo da Influência Austríaca e Alemã na Música do Brasil no Século XX). Musices Aptatio 1991 (Roma).

Salzburger Volksblatt Neukomm
Notícias referentes a W.A. Mozart e S. Neukomm foram sempre enviadas de Salzburg a M. Braunwieser
Considerando o "Ano Mozart", tem-se a oportunidade, neste contexto, de recordar resumidamente o trabalho de Martin Braunwieser dirigido ao cultivo dos ideais do humanismo clássico e da obra de Mozart no Brasil. Nesse sentido, Martin Braunwieser pode ser considerado simbólicamente como um segundo Sigismund Ritter von Neukomm (1778-1858).

Filho de Maria e Franz Braunwieser (1866-1947), Martin Braunwieser nasceu em Salzburg, em 1901. Através de seu pai, um regente cuja dedicação seria futuramente reconhecida com a sua nomeação a mestre-capela honorário da Musikkapelle Maxglan, Martin Braunwieser cresceu em contacto com a música das associações corais e instrumentais de Salzburg. Foi menino de coro e, ao trocar de voz, instrumentista de orquestras-de-igreja. Durante a sua infância, a vida musical profana de Salzburg foi marcada pelas atividades do teatro municipal local e pela realização de festividades musicais em torno do nome de Mozart e que contaram com o apoio dos mais altos círculos da Monarquia Áustro-Húngara. Todas as atenções concentraram-se na construção da Casa Mozart, cuja pedra fundamental foi lançada em 1910. Tanto na esfera sacra, quanto na profana, a formação musical de Martin Braunwieser decorreu sob a égide de Mozart.

Cumpre salientar, aquí, que o Brasil não esteve alheio ao início do culto à memória de Mozart em Salzburg do século XIX. Este teve como marco fundamental a inauguração do monumento ao compositor e a realização da primeira Festa Mozart, em 1842, sob a direção de Sigismund Ritter von Neukomm, que trazia na memória o seu trabalho divulgador da obra de Mozart no Brasil. Após a instituição da Fundação Internacional Mozart, em 1871, o barão Carl von Sterneck (1813-1893), em nome de sua presidência, escreveu uma carta ao imperador do Brasil, .D. Pedro II, solicitando o seu apoio à obra. Em 1874, o Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário do Brasil na França, Visconde de Itajubá, tomava conhecimento da autorização dada ao Ministro na Áustria, Visconde de Porto Seguro, Francisco Adolfo de Varnhagen, para que este auxiliasse com 200 florins a Fundação Internacional Mozart. (M.W. de Aragão Araújo, Pedro II e a Cultura, Rio de Janeiro 1977, 76-77) A sociedade de música da Catedral (Dommusikverein) foi fundada, juntamente com o Mozarteum, meio século após a morte de Mozart (1841).

Mozarteum SalzburgO já existente (antigo) Mozarteum, sob a direção de Alois Taux (1841-1861), Hans Schläger (1861-1868) e Otto Bach (1858-1880) foi uma instituição que promoveu a formação de instrumentistas e incentivou o cultivo doméstico da música, da qual participaram personalidades como J. Joachim (1831-1907), Clara Schumann (1819-1896), J. Brahms (1833-1897) e P. Cornelius (1842-1874). Passando, em 1880, a pertencer à Fundação, o (antigo) Mozarteum teve a sua denominação mudada para Fundação Internacional Mozarteum. Até 1908, o Mozarteum esteve sob a orientação de Joseph Friedrich Hummel (1841-1919). Dois compositores assumiram por curto espaço de tempo a direção da escola: Josef Reiter (1862-1939), de 1908 a 1911, e Paul Graener (1872-1944), de 1911 a 1913/14. Em 1914, ano da inauguração do novo edifício, cuja solenidade não se efetivou pelo assassínio do Príncipe Herdeiro - início da I Grande Guerra -, o escopo do Mozarteum foi definido em função de um "Espírito de Mozart": "(....) a mais alta expressão daquelas forças que de resto atuam silenciosamente, mas não menos energicamente e que foram chamadas para conservar a herança de Mozart (...)" (M. Morold, "Festpräludium", Musica divina, 1914, 299-303, 303

Desde 1914 apresentando a honrosa denominação de Conservatório, outorgada pelo Imperial e Real Ministério de Cultura e Educação da Áustria, o Mozarteum passou por transformações internas destinadas a fazer jus ao novo status. Como os diretores anteriores tinham abandonado o cargo para dedicarem-se à composição, a Curadoria da Fundação procurou dar preferência a musicólogos, institutindo um triunvirato diretivo, encabeçado por Robert Hirschfeld (1858-1914), seguido por Eugen Schmitz (1882-1959). Após um curto período sob a orientação de E. Schmitz, a direção passou provisoriamente às mãos de Josef Hutarry (1871-1967) e Franz Ledwinka (1883-), este auxiliado pelo antigo diretor, Hummel. No dia 2 de setembro de 1917, a Curadoria da Fundação Internacional Mozarteum elegeu o jovem Dr. Bernhard Paumgartner (1887-1971) para dirigir a instituição. Essa nomeação significou o início de um dinamismo sem precedentes na história do Mozarteum. Paumgartner foi diretor do Mozarteum de 1917 a 1938 e de 1945 a 1949, participou da fundação dos Festivais de Salzburg, em 1920, e dirigiu, a partir de 1919, a Orquestra Mozarteum. Como musicólogo, Paumgartner defendeu a união da pesquisa com a prática e, dentre as suas obras, salienta-se a biografia dedicada a Mozart (Mozart, 1940), reeditada várias vezes e publicada em diversos idiomas. Paumgartner foi o grande mentor de Martin Braunwieser, apoiando-o na sua carreira e a ele devotando uma amizade que durou toda a vida. Seria com o seu apoio que Renata Braunwieser realizaria os seus estudos em Salzburg. A tradição musicológica a que se prendeu Paumgartner derivou de seu pai, Dr. Hans Paumgartner, de Guido Adler (1855-1941) e Eusebius Mandyczewski (1857-1927). Sobretudo na tradição fundada por este último erudito é que se enraizou o trabalho de revalorização de J.S.Bach a que M. Braunwieser futuramente se dedicaria.

 

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