Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria
científica
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N° 11 (1991: 3)
Antonio Alexandre Bispo
(Excertos)
Entrando mais especificamente no campo musicológico, Abelardo Duarte republicou, na Revista da Academia Alagoana de Letras (Ano XII/N° 12, 1986, 83-91) um capítulo do seu livro Folclore Negro das Alagoas, com o subtítulo:
"A filiação dos conjuntos nordestinos aos provençais, por via indireta portuguesa, choca-se com a opinião dos observadores."
Nesse estudo, afirma que "o conjunto musical popular mais típico do Nordeste brasileiro é de origem negra". Refere-se à "orquestra popular, à bandinha musical chamada nas Alagoas Esquenta-mulher e em alguns outros Estados nordestinos (pelo menos no Ceará, Paraíba do Norte e Pernambuco) música de couro, zabumba de couro, musica cabaçal ou cabaçal."
0 autor reconhece, por um lado, que "quando os nosscs musicólogos e folcloristas especializados em música descerem às pesquisas de campo, colhendo in loco o material com que enriquecerão o patrimônio do Folclore afro-brasileiro, poderemos melhor apreciar a verdadeira influência, em extensão e profundidade, da arte musical e coreográfica afro-negra na região nordestina do país." Afirma, porém, apesar dessa situação por ele considerada como incipiente da pesquisa, peremptoriamente: "Não se discute a origem negra desses conjuntos" (pág. 86).
A. Duarte critica Luiz Heitor Correa de Azevedo, que diz serem esses conjuntos de tradição européia, filiando-os aos conjuntos da Provença, também encontrados em Portugal. Critica também Oneyda Alvarenga, que alude ao conjunto chamado Bombo, na Beira. Para o autor, "a influência européia nos conjuntos nordestinos em apreço é possível", mas não lhe parece de todo aceitável (pág. 87). Ele fundamenta essa opinião através de descrição de conjunto instrumental encontrada no artigo "Teatro Medieval em São Tomé e Príncipe - O Tchilolo ou a Tragédia do Marquês de Mântua e do Imperador Carloto Magno" de Fernando Reis (Panorama N° 23, IV Série Lisboa, 1967).
Estudos de Fernando Reis e sobretudo a questão da origem do Tchilôli foram já considerados há muito em discussões do ISMPS e citados no primeiro número da Correspondência Musicológica. A. Duarte dá como exemplo de sua tese uma "orquestra" africana de São Tomé como de "subida importância para a tese da identidade afro-negra do Esquenta-Mulher" (pág.88). Como explicação histórica dessa suposição, A. Duarte cita Fernando Reis, que diz que a cultura da cana e a indústria dos engenhos teriam sido abandonados em São Tomé juntamente quando o ciclo se iniciaria no Brasil, para onde se teriam transferidos muitos colonos brancos e escravos negros de São Tomé e Príncipe. Esses escravos negros de São Tomé teriam vindo dar continuidade no Brasil a essa velha usança. Isso reforçaria a sua tese da origem negra desses conjuntos musicais nordestinos.
Essa afirmação de A. Duarte não pode porém ser cientificamente corroborada. Após o já clássico estudo de Martin Braunwieser publicado no Boletim Latino-Americano de Música VI (Rio de Janeiro, 1946), o "Cabaçal" nordestino exige estudos que considerem seriamente as fontes históricas, pois somente assim poder-se-á compreendê-lo no seu significado. Artigos recentes a respeito, inclusive um ensaio publicado na Alemanha, em 1986, manifestam lamentável desconhecimento histórico-musical específico e, deste fato decorrente, interpretações não pertinentes. Se realmente existe vínculos da "música de couro" com São Tomé, esses elos dizem respeito às tradições européias alí assimiladas anteriormente.
(...)