Timbre Correspondencia Euro-Brasileira

Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica
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N° 10 (1991: 2)


 

Penedo AL

Projeto Alagoas II

 

Viagens de contactos e pesquisas do ISMPS:
Penedo, Nilópolis,Propriá, Porto do Colégio, Maceió, Marechal Deodoro, Santa Luzia, Maruim, Porto Calvo
pelos

20 anos da viagem de pesquisas ao Leste e Nordeste do Brasil (Nova Difusão Musical) - Descoberta do passado musical de Penedo 

PENEDO
A "MUI NOBRE E SEMPRE LEAL" CIDADE ÀS MARGENS DO OPARA DOS CAETÉS

A NECESSIDADE DA PESQUISA DOS PRIMEIROS SÉCULOS DE SUA HISTÓRIA DA MÚSICA

 

Antonio Alexandre Bispo

(Excerto)

 

Penedo Coimbra do Sao Francisco
Penedo- "Coimbra" do São Francisco (Foto A.A.Bispo-Acervo ISMPS/IBEM)
O início da história da região dominada pelo penedo às margens do rio Opara dos índios Caetés foi marcada pela extração do pau-brasil e pela sua exploração clandestina. A expedição de João Verrazano teria atingido já em 1522 o local caracterizado pela formação rochosa e efetuado pacto comercial com os indígenas (Ernani Méro, História do Penedo II, 1989, 5). Em 1560, formaram-se na região do penedo as sesmarias de Felipe de Moura, Belchior Alvares Camello e dos Rochas. No mesmo ano, o segundo donatário de Pernambuco, Duarte Coelho de Albuquerque, fundou no penedo uma feitoria, origem verdadeira da atual cidade.

Como São Jorge da Mina, do outro lado do Atlântico, também fundada sobre um rochedo há quase um século, Penedo, sob a proteção do santo nacional e militar de Portugal, Santo Antonio, deveria vir a ser o ponto de apoio, de defesa e de trocas comerciais com a população nativa da região.

Como centro produtor de açúcar, de fumo, mandioca e criador de gado, a povoação, freguesia desde 1615, foi elevada em 1636 à categoria de "Vila do Penedo do Rio São Francisco". Durante a ocupação holandesa, o Conde João Maurício de Nassau ordenou a construção de um forte, que recebeu o seu nome, passando Penedo a denominar-se "Maurícia" (1637-1645), palco do movimento de libertação que tomaria o nome de "Oparina".

Penedo AL Placa Historica
(Foto A.A.Bispo-Acervo ISMPS/IBEM)
O desenvolvimento religioso e cultural da região já tinha sido marcado indelevelmente pela ação missionária, sobretudo dos Franciscanos. O convento de Nossa Senhora dos Anjos de Penedo (1660) foi o quarto fundado pela Custódia autônoma de Santo Antonio do Brasil (Paraguaçú, 1649; Cairu, 1650; São Cristóvão, 1657) e somente a natureza insalubre do local o impediu de tornar-.se sede da Província, com treze conventos, ficando essa em Olinda (até 1689) e na Bahia.

Maria do Carmo Tavares de MirandaO estudo da cultura da região, de suas tradições e do seu "ethos" exige uma especial consideração da espiritualidade e das práticas religiosas daqueles que seguiam a regra de São Francisco de Assis, assim como da importândia dos Franciscanos na implantação da Reforma Católica posterior ao Concílio Tridentino e de sua ação na época da união pessoal de Portugal com Espanha:

"O amor a Deus, ao Cristo, à Virgem Maria, e à Igreja é manifestado no aprêço com que se dedicam solenemente às horas canônicas, e no esplendor com que revestem o culto divino. (...) E as festas litúrgicas, Natal e Ressurreição, o Caminho da Cruz, - Via Sacra -, as missas de Nossa Senhora aos sábados, tudo é motivo para patentearem ao público o objetivo de suas vidas (...)." (Maria do Carmo Tavares de Miranda, Os Franciscanos e a Formação do Brasil, Recife, 1976, 95).

Também outras ordens marcaram a formação da região. Em 1656, Fernão Vaz Freire doou a Ilha Grande aos Beneditinos. Provavelmente com o surto religioso e missionário que experimentou a região após a expulsão dos holandeses deu-se paralelamente um desenvolvimento do cultivo sacro-musical, cujo centro parece ter sido a igreja do convento franciscano, Nossa Senhora dos Anjos, construída a partir de 1682 e ampliada no século XVIII. A sua fachada de 1759 (com figuras de anjos com traços indígenas) e o seu teto pintado em 1784 são indícios de um florescimento artístico na segunda metade do século XVIII e que está exigindo pesquisas histórico-musicais específicas. Do fim desse século data a igreja de Nossa Senhora da Corrente, já considerada, nos seus traços rococós e classicistas, uma das mais belas do Brasil (cf. G. Bazin, Aleijadinho et la Sculpture baroque au Brésil, Paris, 1963). De particular interesse iconográfico-musical é a imagem de Santa Cecília, decorada a ouro, que, juntamente com a de Santa Luzia, pertence à coleção denominada "Pastoril".

Obras do compositor de origem portuguesa e mestre-capela de Salvador Pe. Theodoro Cyro de Souza (*1766) permaneceram durante décadas no repertório da Semana Santa local, conhecida em toda a região pelo seu aparato: Para a Sexta Feira Santa - Crux Fidelis (cópia de 1897); Passio Domini Nostri Jesu Christi Secundum Joannem; Alleluia para Sábado Santo; Gradual da Missa de Quinta Feira Santa; Oficio de Trevas para Quarta Feira; Motetos para os Passos da Procissão do Senhor (cf. os seus Motetos publicados pelo editor no Boletim N° 2 da S.B.M.).

Penedo permaneceu no centro do campo de forças das influências culturais determinado por Recife e por Salvador. Durante a Revolução de 1817, Penedo distinguiu-se por sua lealdade ao Rei, sendo a vitória das armas legalistas comemorada com grande aparato. Essa fidelidade manteve-se também por algum tempo após a independência, como se depreende de um ofício do ouvidor, de 1824:

"Não posso deixar de estranhar que nesta villa, tendo o melhor credito de mais ilustrada das desta província, se conservem nos lugares publicos della as armas do reino de Portugal (...)." (José Prospero Jehovah da Silva Caroatá, "Chronica do Penedo", Revista do Instituto Archeologico e Geographico Alagoano 2, pág. 4).

Em 1824, a Irmandade do Santíssimo Sacramento comprou um grande órgão de dois teclados, de fabricação francesa (E. Méro, op.cit. 20). Documentos musicais indicativos de estreitos vínculos com o centro musical da Côrte são composições de D. Pedro I (1798-1834), Marcos Antonio da Fonseca Portugal (1762-1830) e Fortunato Mazziotti (+1855) constatadas em acervos da cidade em visita a Penedo no início da década de 70. Deste último compositor, aluno de Eleutério Leal do Seminário da Patriarcal de Lisboa, cantor, mestre e compositor da Real Capela no Rio de Janeiro, destaca-se um divulgado Credo, também executado em Penedo, onde se manteve no repertório até fins do século XIX. A sua cópia (1837) data da época em que Penedo foi elevada à categoria de cidade (1842, pela lei provincial n° 3 de 18 de abril). Notável é o solo de clarinete no "et incarnatus".

Nome que se conservou na memória dos penedenses do século XIX foi o do franciscano Frei José de Santa Engrácia: "filho de José Joaquim Pacheco, erudito, pregador eloquente e arrebatador, admirado não só no Penedo, como na ilustrada Bahia em cujos templos sua voz altisonante retumbou muitas vezes; musico insigne, autor de muitas peças desta arte, que são ainda hoje apreciadas (1872)" (José P.J.S. Caroatá, op.cit. 7). Outro franciscano músico foi também Frei Capistrano de Mendonça.

(...)

 

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